sábado, 28 de junho de 2008

OS PALANQUES PRECOCES ARMADOS COM DINHEIRO PÚBLICO

O Globo Online

Dilma Roussef é apontada por gregos e troianos como a escolhida de Lula para concorrer à sucessão presidencial, já que até segunda ordem -- ou emenda constitucional -- ele próprio está legalmente impedido de disputar as próximas eleições.

Sobre isto, Lula vem repetindo que a alternância de poder é importante, que é um democrata, e que respeita a Constituição brasileira. "Sou contra a tese do terceiro mandato", disse em alto e bom som.

É também em alto e bom som que o presidente da República vem dizendo -- na verdade, afirmando categoricamente -- que fará seu sucessor em 2010. Até aí, nada demais, a não ser pelo já conhecido esmero demagógico com que Lula costuma se vestir quando transpira ódio de classe diante de platéias contratadas a pingados caraminguás.

O problema é que toda esta disposição para abençoar e emplacar o próximo candidato petista a presidente do país vem sendo posta em prática desde já, com dinheiro público e na base dos chutes e pontapés na lei eleitoral brasileira.

O respeito que aparenta e diz ter pela alternância democrática de poder, Lula parece trocar por total desprezo quando se trata de regras que o impedem, por exemplo, de armar palanques Brasil afora a custa dos impostos pagos pela população.

Como atenuante, pode-se argumentar que eventuais desdéns pela legalidade e pelas instituições não lhes são exclusividade. Ao contrário. Por outro lado, como agravante, há o fato de que Lula vem armando palanques precoces e ilegais como "nunca antes na história deste país".

No dia 17 de abril, em Belo Horizonte, durante um evento de vistoria de obras do Programa de Aceleração do Crescimento na capital mineira, Dilma Roussef chegou a dizer o seguinte, ao lado de Lula e diante da torcida organizada:

- Queria desejar e dirigir um especial cumprimento às mulheres aqui da frente, que hoje animam, sem dúvida, este comício.

"Comício"? Era um ato oficial, um evento institucional. Ao noticiar o fato, a imprensa chamou de deslize, gafe, ato falho e que tais. Mas à ministra-chefe da Casa Civil deve-se mesmo é creditar o mérito de chamar as coisas pelos nomes que elas têm.

Parece truísmo picareta. No entanto, por incrível que pareça, ao que tudo indica a estratégia é esta mesmo: Lula apresenta o Programa de Aceleração do Crescimento ao distinto público como um grande esforço de reparação das injustiças históricas que se praticou contra os pobres do país; em seguida, inicia-se uma verdadeira turnê, na qual o presidente percorre todo o território nacional com Dilma Roussef a tiracolo, dizendo que ela é a "mãe do PAC"; depois, a conclusão óbvia é que, se Lula é o pai dos pobres, adivinhe quem Dilma é. Estivessem vivos, Perón e Evita ficariam enrubescidos.

A turnê vem sendo longa, e pelo caminho vão se valendo dela os aliados do PT em cada município brasileiro que recebe a comitiva oficial.

É uma verdadeira festa itinerante, que vai contabilizando votos por onde passa para os possíveis candidatos a prefeito nas eleições de outubro, os do próprio PT ou quaisquer outros que gozam do privilégio inigualável de contar com a mãozinha da pouco constrangida máquina eleitoral do PAC.

De norte a sul, neste ano eleitoral, as inaugurações-comícios do PAC não foram poucas até agora, e vêm sendo temperadas com o populismo eleitoreiro de hábito.

Desde Teresina, no Piauí, onde o presidente falou que está "cansado de ver nordestino sendo tratado como pedreiro", ao Rio de Janeiro, onde o governador Sérgio Cabral chegou a se referir a Dilma como "presidente". Depois, Cabral disse que estava confundindo as bolas. Diante das circunstâncias, nem tanto.

Mas foi no lançamento de obras do PAC em Manaus que Lula protagonizou o episódio mais grotesco da série de afrontas que vem cometendo contra a lei eleitoral brasileira. Do alto do palanque, microfone na mão, e com tom messiânico que lhe é peculiar, o presidente decretou: "vou eleger meu sucessor".

Foi a deixa para a platéia gritar em coro: "Dilma! Dilma! Dilma!". Depois, Lula emendou: "Vocês viram que eu, por cuidado, não citei nomes. Vocês é que, de enxeridos, gritaram nomes aí".

A claque foi ao delírio: "Dilma! Dilma! Dilma!".

A título de lançamento de obras do PAC, a comitiva de Lula e Dilma já visitou 27 municípios em 2008, a grande maioria deles governada por prefeitos de partidos da base aliada do governo federal.

O curioso é que qualquer explicação para tanto alarde que não seja a eleitoreira não resiste a uma ligeira observação dos números: dos R$ 17,2 bilhões autorizados para obras do PAC neste ano, apenas R$ 1,9 bilhão foi comprometido até agora, sendo que R$ 13,7 milhões foram efetivamente gastos.

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio de Mello criticou publicamente a peregrinação de Lula para inaugurar obras nos quatro cantos do país a poucos meses das eleições municipais.

No início deste mês, o jornalista Ricardo Noblat revelou em seu blog o que ouviu de dois ministros do STF: o comportamento de Lula e Dilma é um deboche à lei eleitoral.

No dia 9 de março, pouco antes uma cerimônia no Palácio do Planalto para o lançamento do programa Banda Larga nas Escolas, Lula apareceu de braços dados com Dilma Roussef diante dos jornalistas, e disse: "Trouxe a Dilma aqui pra sorrir pra vocês".

Pode-se dizer que arrastou a ministra pelo braço para, mais uma vez, mostrá-la ao país a troco de nada, de onde cabe a pergunta: ele trouxe a Dilma para rir para a gente, ou para rir de nós?
Hugo Souza -

globinho

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