sexta-feira, 14 de março de 2008

200 anos de que?

Efusivamente tem-se propalado, nos meios de comunicações, as festividades comemorativas aos 200 anos da chegada da família real ao Brasil. Obviamente, a vinda da distinta família às terras tupiniquins representou um avanço para a então Colônia portuguesa.

Dom João, teve seus méritos, em especial na promoção das artes e das ciências. Porém, não devemos esquecer o quanto de malévolo representou esse período na história brasileira. Muitos são os episódios insólitos, os casos de corrupção, esperteza e arrogância que envolveu a corte no período da aventura tropical.

Trata-se e mostra-se um rei bonachão e comedor de frangos (600 quilos ao dia era a quantidade de aves necessárias para alimentar a incomensurável fome da família real e seus convivas). No entanto, pouco se fala nas peraltices de infante Dom Pedro e seu inseparável amigo Chalaça, das suas aventuras amorosas, da venda dos pangarés, do tráfico de influências de Domitila (a marquesa de Santos) e suas mansões custeadas pelo dinheiro da coroa.

Dar-se um ar de altivez, bravura e nobreza até mesmo na famosa cena da proclamação da independência, quando o infante encontrava-se em São Paulo, fazendo sabe-se lá o que e montado em um jumento, catapultado a condição de belo cavalo puro sangue e selo real. Soldados em uniforme de gala – piada. Visão épica distorcida de qualquer contexto de realidade.

Por seu turno, o intrépido Dom João dava mostras constantes da sua dependência do império britânico e de seus interesses. Promoveu-se a abertura dos portos, o financiamento público e dos luxos da corte portuguesa a base do primeiro endividamento externo do Brasil. Deflagrou-se uma guerra imoral com o Paraguai tudo a mando e interesses da real coroa (a inglesa).

Vejo mais os prejuízos que as benesses em relação a esse período da história do Brasil. Nele, se avolumaram os gastos, o tráfico de influências e comissionamentos. O apadrinhamento político, um número sem-fim de casos de corrupção e escândalos, a apropriação de bens, o aumento sem precedentes da concessão de títulos nobiliários em troca de doações de propriedades.

Não menos espetacular foi o retorno da corte às terras portuguesas, quando o “bonachão” levou consigo todo o lastro econômico da colônia, deixando-a a bancarrota.

Não vejo motivos para faustos. Antes, é motivo de lamento. É necessário contar a história como ela efetivamente aconteceu e tê-la como uma farsante, afinal as mesmas mazelas ainda assolam a nação e a pátria brasileira. Então, revivamos Machado[1] - “Ao vencedor, as batatas!”.

Cônscios de que nossa atualidade reproduz ipsi literis aqueles dias de Dom João, necessário se faz tratar os fatos não como mera semelhança. Infelizmente (para o povo brasileiro), é questão de maldita e hedionda herança.


Alexandre Carneiro Gomes de Melo

É Pós-graduado em capacitação pedagógica

Presidente do Instituto Collectivus

Organizador do Blog do Limão


[1] Assis, José Machado. Quincas Borba – Rio de Janeiro – Brasil – Fundação Biblioteca Nacional

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